Uma crônica destinada a nossas insatisfações
Dia quente, quentíssimo, estressante por enclaves familiares e atacado por meus problemas de saúde. O stress me consome e o calor me derrete, para a resolução desses dois problemas há um remédio fácil de se encontrar em qualquer residência minimamente digna: água. Um gole de água gelada e uma represa para desaguar em minha cabeça tendo como origem quilômetros de encanamentos marcados no fim pelo engenhoso chuveiro. O relógio pega voo e como barulho do seu atrito com ar se ouve um tic-toc, tic-toc constante. O pouso do relógio já marca um horário que não é mais dia, não é mais entardecer, o tempo passou mas o calor ficou.
A noite de verão me proporcionou uma chance de procrastinar — “pois é deveras dificultoso ser produtivo em calor tão árduo!”, a minha mente me sabotara — e rapidamente saco o controle da TV 55" de origem coreana e que me salvaria do afogamento do tédio. Um filme eu escolhi e enviesado por movimentos artísticos, — que não me interessavam nem um pouco no passado e agora toma tempo em minhas leituras — escolhi o filme de nome Meia Noite em Paris. Estrelado por Owen Wilson, ator cujo nariz é tão grande mas não ao ponto de alcançar o tamanho do meu, a trama conta a história de um escritor que viajara a Paris e todos os dias a meia noite em ponto é resgatado por artistas da época que o homem julgava ser a Era de Ouro de Paris.
O filme é muito bem construído — estou tendo o cuidado de não transformar esse texto em crítica ou numa sinopse — e ao decorrer da película o final se tornou óbvio para mim, o personagem percebera que nunca estamos satisfeitos com o tempo em que vivemos. O passado sempre parece ser melhor, mais grandioso, repleto de novas descobertas e achados incalculáveis.
E isso foi o estopim para milhares de pensamentos eletrocutados pelos meus neurônios. Aquilo me fez refletir em como somos insatisfeitos com o que possuímos e com o que nos é cabível. Será que se vivêssemos em um tempo diferente seria melhor? Seria mais fácil descobrir o átomo se ele ainda não fosse descoberto?
Não se trata só do tempo passado. Se trata de uma insatisfação que permeia o ser humano, sempre almejamos o que não podemos ou não temos ainda. É fácil dizer que no passado as coisas eram melhores e mais tranquilas, pois o presente é nebuloso. O presente é o agora e o agora está acontecendo a cada segundo e assim como o presente já foi o passado. E dali surgiram várias coisas que nos compõe em toda nossa completude, afinal as coisas do passado já foram feitas. O presente depende da nossa atitude em alcançar sonhos e esses sonhos revelam um eterno dilema de uma ambição deveras paradoxal: almejamos um objetivo, conquistamo-o, criamos um novo. Repetidamente. De novo e de novo, nunca estamos satisfeitos.
Esse arquétipo se estende para outras aplicações, como por exemplo, a desculpa de que para fazer algo melhor precisamos de um equipamento mais sofisticado, para ser feliz preciso de um carro mais novo e potente e após conseguir esse carro, no ano seguinte o meu modelo é muito ruim e preciso urgentemente do mais novo e ainda mais potente. Desde o tempo que vivemos até os objetos que consumimos, sempre há uma insatisfação e a procura por algo que nos supra.
O meu objetivo era escrever esse texto e como ele está concluído, agora meu objetivo é dormir. Não sei o que me aguarda amanhã. Não sei o que me aguarda o futuro e também não sei se um dia estarei satisfeito com o que alcancei ou deixei de alcançar.